
O
Reverendíssimo Padre Lodi diz que a finalidade do namoro é “o
conhecimento da alma do outro.” Esse conhecimento da alma é conhecer as
qualidades e defeitos, naturais e sobrenaturais, do outro, bem como
conhecer qual é o “ideal” de vida do outro. Todavia, as condições para
que um jovem e uma jovem possam construir com segurança um lar católico
são quatro:
1. Uma grande estima mútua;
2. Uma profunda simpatia mútua;
3. Uma profunda confiança mútua;
4. Acordo quanto ao ideal.
A
finalidade do namoro deve ser verificar a existência dessas quatro
condições ou desenvolvê-las. O que segue é baseado na obra do Padre
François Dantec, Fiançailles Chrétiennes.
1. Estima mútua.
A
estima é reconhecer no outro certas qualidades e certos valores reais e
apreciar de modo particular essas qualidades e esses valores. Essa
estima deve ser, portanto, motivada, ela deve ter um motivo real e ser
séria, e não ser baseada em impressões ou sentimentos. Essa qualidade e
esses valores nada mais são do que as virtudes. Eis aqui o verdadeiro
título de nobreza e o tesouro mais precioso para que um lar digno seja
fundado. Antes de escolher o cônjuge, é preciso prestar atenção nas suas
qualidades morais, naturais e sobrenaturais. Se há um defeito grave e
de difícil correção no outro, não se deve hesitar em romper o
relacionamento. Se, ao contrário, constata-se a presença das virtudes no
outro, a estima pode ser dada ao outro. Essa estima é o primeiro passo
para o verdadeiro amor entre os que querem se casar.
2. Simpatia.
A
simpatia aqui quer dizer uma certa inclinação ao outro. Em geral, ela
decorre da estima de que falamos acima. Assim, também a simpatia deve
ser motivada. Todavia, pode haver casos em que há estima sem que haja a
simpatia. Os sinais dessa simpatia são o desejo de rever o outro, a
alegria de se encontrar e de conversar juntos, ter o pensamento
inclinado para o outro, preocupar-se com os problemas e preocupações do
outro, etc… Convém deixar claro que essa simpatia não é uma atração
sensível ou física. É necessário para noivar e casar que haja atração
entre os dois, mas uma atração como a simpatia que descrevemos acima.
Não é necessário que haja uma atração física, sensível, que faça o
coração palpitar. Isso é de uma importância prática extrema, pois nada
há de mais instável e variável que a sensibilidade e essa inclinação
física. A pretensão de construir o lar sobre uma base tão instável é
viver na ilusão e construí-la sobre a areia. O casamento vai desmoronar.
O matrimônio precisa ser baseado na estima motivada e na simpatia que
deriva dessa estima, em virtude das qualidades morais reais do outro.
Está claro que a inclinação física e sensível não é em si um mal e pode
ser um bem, desde que não levem a pessoa a tomar decisões baseadas
nelas. Se essa inclinação física e sensível está ausente, mas estã
presentes a estima, a simpatia e as outras condições de que falaremos,
os jovens podem se casar com confiança. Se a simpatia mútua está
ausente, é muito imprudente casar. Essa ausência de simpatia pode
acontecer mesmo entre um jovem e uma jovem católicos e virtuosos. Seria
muito imprudente casarem sem ter simpatia um pelo outro ou tendo
antipatia pelo outro. Também seria imprudente casarem se houvesse alguma
espécie de repugnância física pelo outro. A graça baseia-se na
natureza. Se no campo natural existem fatores que desaconselham o
matrimônio, seria difícil que a graça suprisse tais problemas. Qualquer
que seja a causa dessa antipatia, consciente ou inconsciente
(incompatibilidade de temperamento, diferença de idade, de cultura,
etc.), trata-se de uma contra-indicação seríssima ao casamento, pois
seria expor-se mais tarde a provações muito frequentes e muito fortes,
com risco para o casamento.
3. Completa confiança mútua.
Além
da estima e da simpatia, é preciso que haja confiança, para que haja um
casamento feliz. É preciso que a outra pessoa seja digna da confiança,
que seja possível ter certeza quando ela diz algo. Essa confiança é
também ter certa segurança e estabilidade, fundada nas qualidades reais
do outro. Além disso, essa confiança é ter por certo que é possível se
apoiar no outro para enfrentar as dificuldades, as provações, os
sofrimentos. A vida matrimonial é completamente distinta da vida
anterior: o cônjuge já não está mais só. No melhor e no pior, na riqueza
e na pobreza, na saúde e na doença, é preciso ter a certeza de poder
contar com o outro. Para casar, os namorados/noivos devem ter essa
confiança profunda no outro. Essa confiança é motivo de muita força e
alegria para a vida do casal. Essa confiança mútua tem também o sentido
de que um cônjuge se confia ao outro, quer dizer, que não guarda
segredos para o outro. Claro que há graus e etapas nessa abertura mútua.
O essencial é que um esteja à vontade com o outro (no bom sentido),
para confiar ao outro tudo o que vale realmente a pena e para contar
tudo o que seria desleal ou imprudente esconder.
4. Acordo quanto ao ideal.
Um
ponto fundamental para escolher o futuro cônjuge é o acordo sobre o
ideal. Sem essa condição essencial que é esse acordo quanto ao ideal, a
futura família não tem praticamente qualquer chance de formar um lar
verdadeiramente cristão e verdadeiramente feliz no sentido cristão de
felicidade. Sem um considerável acordo quanto às principais questões da
vida, seria impossível manter a união de corações e de almas, união
necessária para que haja verdadeiro amor cristão.
A. O que não é
esse acordo. Esse acordo não é partilhar necessariamente as mesmas
ideias sobre todas as coisas nem ter o mesmo gosto em todos os domínios.
Esse acordo não suprime, portanto, diferenças que são legítimas e, por
vezes, providenciais. Esse acordo não significa uma uniformidade total
ou a supressão de personalidades. Também não é necessário que exista,
desde o começo, um acordo perfeito das ideias e sobre todos os detalhes
da vida prática.
B. O que é esse ideal? Esse ideal é uma certa
comunhão de visão e de juízo quanto ao sentido da vida e sobre os
grandes problemas da vida conjugal. Na prática, esse acordo consiste em
saber se as duas partes aceitam a doutrina católica em geral e sobre o
casamento em particular. Para se interrogar sobre esse acordo e poder
avaliar a sua existência, é preciso que os namorados se perguntem se são
verdadeiramente católicos ou não.
C. Acordo quanto ao sentido
cristão da vida. Como fundamento, os que pretendem casar devem estar de
acordo quanto ao sentido cristão da vida. O sentido cristão da vida é
dado, antes de tudo, pela profissão firme da fé, com plena aceitação dos
ensinamentos de Cristo e da Igreja. Esse acordo consiste em que ambos
saibam que essa vida é tão somente uma passagem para a vida futura, que
fomos criados para sermos felizes no céu, depois de termos conhecido,
amado e servido a Deus aqui na terra. Esse acordo consiste em buscar em
primeiro lugar o reino dos céus, evitando todo pecado como o maior mal
que existe. Além disso, esse acordo deve ter em vista também a busca da
prática das outras virtudes, além da fé, da esperança e da caridade: a
humildade, a paciência, a fortaleza, a pureza… Esse acordo deve
consistir no fato de reconhecer que essa vida é um combate, em
reconhecer que somos discípulos de um Mestre que morreu crucificado e
que nós não somos maiores que Ele. Esse acordo deve consistir no
reconhecimento de que somente a verdadeira religião revelada por Deus
pode nos salvar e trazer a solução para os nossos problemas. Esse acordo
consiste na disposição firme de permanecer fiel a Cristo e à Igreja,
apesar de todos os desvios e ciladas do mundo. Esse ideal sobre o qual
os namorados devem estar de acordo é, em resumo, a conformidade em todas
as coisas com a vontade de Deus.
D. Acordo quanto ao sentido
cristão do casamento. Se o acordo deve dizer respeito a todas as
questões importantes da vida, é evidente que ele tem que se estender
especialmente ao casamento. Basta refletir um pouco e superficialmente
para chegar à conclusão que a falta de acordo nesse domínio levará a um
lar infeliz. Não deixar jamais passar esse ponto, como se pudesse ser
resolvido depois. Depois, será tarde. É preciso perguntar-se seriamente,
com lucidez e coragem, se o acordo existe quanto a esse ponto. O acordo
deve ser sobre:
i. O dever de fecundidade. Estão de acordo
quanto àquilo que é o primeiro dever do matrimônio? Estão de acordo com a
doutrina católica quanto à generosidade no número de filhos? Estão de
acordo quanto ao fato de que é pecado mortal evitá-los pelos denominados
métodos artificiais? Estão de acordo que os métodos naturais só podem
ser usados sem culpa se houver uma causa grave para isso?
ii.
Dever de educar catolicamente os filhos. Estão de acordo no que toca ao
grave dever de assegurar a educação católica dos filhos?
iii.
Dever de amor mútuo. Estão de acordo quanto ao sentido cristão desse
amor mútuo, que é, antes de tudo, um amor derivado da caridade, que quer
o bem do outro e age para o bem do outro, sobretudo para a salvação
dele? Estão de acordo em sacrificar bens materiais, para assegurar os
deveres matrimoniais, se necessário? Estão convencidos de que a vida
comum é a regra e de que uma vida separada só pode ser cogitada em
função de razões excepcionalmente graves?
iv. Dever de fidelidade
e natureza indissolúvel do matrimônio. Não custa lembrar esses dois
pontos. Estão de acordo que o matrimônio é uma união exclusiva entre
eles e que essa união não pode ser desfeita, a não ser pela morte de um
dos cônjuges?
E. No caso de desacordo grave. Se um acordo
suficiente não existe – e não há nenhuma esperança séria e fundada de
que ele possa existir – é preciso tirar as conclusões que se impõem.
Essa esperança diz respeito ao tempo de namoro e não ao tempo de casado.
Seria enormemente imprudente casar esperando que esse acordo venha a
existir, seria um erro quase certamente fatal. No caso de desacordo
grave quanto ao ideal, é preciso cortar imediatamente as relações que
levariam certamente a um casamento infeliz e cheio de problemas de
consciência. Esse desacordo grave pode ser religioso porque o outro é
anticristão, ateu, indiferente à religião, ou porque ele é cristão, mas
não é católico. Nesse caso, o desacordo é evidente. Esse desacordo
existe também quando o outro é um católico profundamente medíocre,
colocando toda a sua felicidade aqui na terra, recusando todo esforço
sério moral e espiritual, fechando-se aos chamados da graça. Esse
católico profundamente medíocre é aquele que se tornou incapaz de
compreender e de apreciar todas as formas de sacrifício, de grandeza e
de desapego dos bons cristãos. Trata-se do cristão tíbio. Ele pode ter
certas qualidades humanas, talvez brilhantes, mas seu cristianismo não
tem praticamente nenhuma influência em sua vida. Ele não vê as coisas
com os olhos da fé. É preciso prestar muita atenção nessa mediocridade
ou tibieza, que muitos não levam realmente a sério na hora de tomar uma
decisão. Diante da mediocridade do outro, é preciso romper a relação. A
infelicidade seria certa, bem como os problemas de consciência e a falta
de um amor realmente cristão. Tais conselhos podem parecer duros, e
eles o são, de fato. Todavia, deixar de dizer essas verdades salutares
seria servir muito mal as almas, seria uma aparente caridade contrária à
verdadeira caridade.
F. No caso de acordo. Se esse acordo é
praticamente completo e se as outras condições estão presentes (estima,
simpatia, confiança), trata-se de uma graça imensa. É normal e desejável
que busquem tal acordo e que não negligenciem nada para chegar até ele.
Esse acordo será, normalmente, a garantia de um lar verdadeiramente
feliz, radioso. Com frequência, porém, esse acordo não será completo,
pois talvez o outro não tenha a generosidade desejada. Todavia, essa
falta de generosidade nunca pode chegar ao ponto da mediocridade ou da
rejeição da fé católica. Além da fé e de um certo fervor, é preciso que
se exija também um mínimo de virtudes naturais, tal como a lealdade, a
sobriedade, a retidão, a coragem, a mansidão, etc… Com isso, embora não
haja um acordo completo, é possível esperar um casamento em que os
cônjuges possam pouco a pouco se santificar, a não ser que a parte menos
católica seja aquela com a personalidade mais forte. Para casar sem ter
esse mínimo de acordo sobre o ideal seria preciso haver razões bem
graves, o que é raro.
Pe. Daniel Pinheiro, IBP